sábado, maio 17, 2008

A Insegurança Alimentar e os Estados Falhados

«It is an accepted axiom of the modern age that distance no longer matters

A agudização da crise alimentar que se manifesta pelo mundo fora pode conduzir a um agravamento da insegurança internacional. As causas desta crise alimentar não são meramente conjunturais e portanto são de prever desenvolvimentos preocupantes.
A revista Foreign Policy publica todos os anos, na sua edição de Julho/Agosto, o Índice dos Estados Falhados (ou em risco) elaborado pelo The Fund for Peace e pelo Carnegie Endowment for International Peace.


Basicamente, um Estado falhado é aquele que não consegue assegurar a sua presença ou domínio sobre a integridade do seu território. Casos extremos conhecidos são o Afeganistão, controlado de há muito pelos senhores da guerra e pelo talibãs, a Somália, o Sudão ( a crise do Darfur) e, mais recentemente, o Iraque. Os estados falhados ("failed") ou em vias de desintegração ("failing") estão a assumir um destaque crescente na política internacional. Como observa o "The Fund for Peace": "Failed states have made a remarkable odyssey from the periphery to the very center of global politics".



O Índice é construído com base numa série de indicadores sociais, económicos e políticos , tais como:
  • pressões demográficas;
  • movimento maciço de refugiados e deslocados internos, que geram graves crises humanitárias;
  • violência entre grupos étnicos;
  • acentuado declĩnio económico;
  • desigualdades económicos entre diferentes grupos/etnias;
  • criminalização ou deslegitimação do Estado;
  • progressiva deterioração dos serviços públicos;
  • ascensão de elites que representam facções;
  • intervenções externas nesses países.
Ler Mounting Stresses, Failing States pág. 123 (da obra Plan B 3.0 disponível em PDF online).
A insegurança alimentar, ou seja, a disponibilidade e acesso aos alimentos, tem vindo a agravar-se num número crescente de países e existe uma certa equivalência entre os países que ocupam o Top 20 da tabela do Índice dos Estados Falhados e aqueles onde se verificam motins pelo aumento dos preços dos alimentos. Ler Deteriorating Oil and Food Security, pág. 46.

Como se sabe, algumas das razões desta crise alimentar podem ser imputadas aos países ricos: o incentivo aos agrocombustíveis, a relativa indiferença pelas alterações climáticas, as políticas comerciais, etc.
Ora, os países ricos parecem comportar-se como se as consequências das suas acções não pudessem ter um efeito de "boomerang". No entanto, dizem-nos que querem combater o terrorismo e que a sua presença no Afeganistão é para assegurar que o país não caia outra vez no caos. Já começam a admitir, finalmente, que não conseguem controlar a situação. Já se fala em desviar um oleoduto proveniente da Ásia Central, fazendo-o passar pelo Paquistão, outro país em risco, com a agravante de possuir armas nucleares.

Por outro lado, existe outra contradição. A economia globalizada significa que estamos dependentes de uma infraestrutura que transporta bens essenciais a essa economia, nomeadamente matérias-primas e energia. Ora, muitos destes estados desintegrados ou em vias de, são fornecedores ou dão passagem à circulação destes bens. Como se pode esperar que os países ricos não venham a pagar caro a sua imprudência? Um exemplo recorrente é a Nigéria, maior exportador de petróleo de África. As desigualdades, como refere o Fundo para a Paz, estão na origem das constantes sabotagens dos rebeldes do Delta do Níger. Recentemente, assistimos a actos de pirataria dos tempos modernos: um pesqueiro espanhol feito refém ao largo da Somália, um petroleiro japonês atacado ao largo do Yemén, e os exemplos repetem-se.
Um dos países que corre
o risco de se tornar um Estado falhado é o Egipto (veja a reportagem da Al Jazeera). No entanto, a UE quer fazer passar por lá um gasoduto. Não podemos pensar que somos imunes à desgraça dos outros.

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