Por altura da Cimeira do Clima em Cancun, surgiu uma notícia de que alguns cientistas defenderam a necessidade de promover o racionamento da energia à semelhança do ocorrido na Segunda Grande Guerra. Afirmava-se que, para reduzir as emissões de CO2 e permitir algum crescimento económico nos países pobres, os países desenvolvidos teriam que suspender o seu crescimento para os próximos 20 anos. Agora, num artigo publicado na "Philosophical Transactions of the Royal Society", Kevin Anderson, ex-director do Tyndall Centre for Climate Change da Universidade de Manchester, e Alice Bows, afirmam que as metas que têm vindo a ser fixadas nas últimas cimeiras são incoerentes com os resultados que vêm sendo fornecidos pela ciência, nomeadamente o objectivo de limitar o aquecimento global a 2ºC. Mais importante ainda, para travarmos as emissões de CO2, não é possível manter o crescimento económico o que exigirá uma "austeridade planeada". Excerto da conclusão do artigo:
«In relation to the first two issues, the Copenhagen Accord and many other highlevel policy statements are unequivocal in both their recognition of 2ºC as the appropriate delineator between acceptable and dangerous climate change and the need to remain at or below 2ºC. Despite such clarity, those providing policy advice frequently take a much less categorical position, although the implications of their more nuanced analyses are rarely communicated adequately to policy makers.
Moreover, given that it is a ‘political’ interpretation of the severity of impacts that informs where the threshold between acceptable and dangerous climate change resides, the recent reassessment of these impacts upwards suggests current analyses of mitigation significantly underestimate what is necessary to avoid dangerous climate change. Nevertheless, and despite the evident logic for revising the 2ºC threshold, there is little political appetite and limited academic support for such a revision. In stark contrast, many academics and wider policy advisers undertake their analyses of mitigation with relatively high probabilities of exceeding 2ºC and consequently risk entering a prolonged period of what can now reasonably be described as extremely dangerous climate change.
Put bluntly, while the rhetoric of policy is to reduce emissions in line with avoiding dangerous climate change, most policy advice is to accept a high probability of extremely dangerous climate change rather than propose radical and immediate emission reductions.
[...] However, given the CCC acknowledge ‘it is not now possible to ensure with high likelihood that a temperature rise of more than 2ºC is avoided’ and given the view that reductions in emissions in excess of 3–4% per year are not compatible with economic growth, the CCC are, in effect, conceding that avoiding dangerous (and even extremely dangerous) climate change is no longer compatible with economic prosperity. [...]
By contrast, the logic of such studies suggests (extremely) dangerous climate change can only be avoided if economic growth is exchanged, at least temporarily, for a period of planned austerity within Annex 1 nations and a rapid transition away from fossil-fuelled development within non-Annex 1 nations.
However, this paper is not intended as a message of futility, but rather a bare and perhaps brutal assessment of where our ‘rose-tinted’ and well intentioned (though ultimately ineffective) approach to climate change has brought us.
Real hope and opportunity, if it is to arise at all, will do so from a raw and dispassionate assessment of the scale of the challenge faced by the global community. This paper is intended as a small contribution to such a vision and future of hope.
«In relation to the first two issues, the Copenhagen Accord and many other highlevel policy statements are unequivocal in both their recognition of 2ºC as the appropriate delineator between acceptable and dangerous climate change and the need to remain at or below 2ºC. Despite such clarity, those providing policy advice frequently take a much less categorical position, although the implications of their more nuanced analyses are rarely communicated adequately to policy makers.
Moreover, given that it is a ‘political’ interpretation of the severity of impacts that informs where the threshold between acceptable and dangerous climate change resides, the recent reassessment of these impacts upwards suggests current analyses of mitigation significantly underestimate what is necessary to avoid dangerous climate change. Nevertheless, and despite the evident logic for revising the 2ºC threshold, there is little political appetite and limited academic support for such a revision. In stark contrast, many academics and wider policy advisers undertake their analyses of mitigation with relatively high probabilities of exceeding 2ºC and consequently risk entering a prolonged period of what can now reasonably be described as extremely dangerous climate change.
Put bluntly, while the rhetoric of policy is to reduce emissions in line with avoiding dangerous climate change, most policy advice is to accept a high probability of extremely dangerous climate change rather than propose radical and immediate emission reductions.
[...] However, given the CCC acknowledge ‘it is not now possible to ensure with high likelihood that a temperature rise of more than 2ºC is avoided’ and given the view that reductions in emissions in excess of 3–4% per year are not compatible with economic growth, the CCC are, in effect, conceding that avoiding dangerous (and even extremely dangerous) climate change is no longer compatible with economic prosperity. [...]
By contrast, the logic of such studies suggests (extremely) dangerous climate change can only be avoided if economic growth is exchanged, at least temporarily, for a period of planned austerity within Annex 1 nations and a rapid transition away from fossil-fuelled development within non-Annex 1 nations.
However, this paper is not intended as a message of futility, but rather a bare and perhaps brutal assessment of where our ‘rose-tinted’ and well intentioned (though ultimately ineffective) approach to climate change has brought us.
Real hope and opportunity, if it is to arise at all, will do so from a raw and dispassionate assessment of the scale of the challenge faced by the global community. This paper is intended as a small contribution to such a vision and future of hope.
9 comentários:
O relatório do grupo parlamentar sobre a energia e pico do petróleo do R.U. também propõe um sistema de racionamento em caso de emergência, desde que menor aos 90 dias de reservas mínimas a que a IEA obriga.
Na verdade, não só o R.U. está a acumular a que deve ser a maior reserva de petróleo da UE (e a única que está em segredo de estado) como é normalmente assumido que a opção de racionamento de combustível é um hara-kiri político, tal como deixar os preços de bens alimentares subirem. Mas no fundo são inevitabilidades práticas num cenário de escassez.
Os políticos e público em geral vão sempre pressionar pela via da facilidade a curto prazo, ou seja, a eliminação drástica da carga fiscal sobre os combustíveis, tendência visível nos queixumes quotidianos contra a Galp e na greve de camionistas que se avizinha a pedir isto mesmo. Vai ser por aqui que o ciclo começa.
A ordem de acontecimentos para um cenário de 3 meses de preços acima dos 120$/barril numa economia recessiva é evidente:
1. Pressão popular para descida da carga fiscal (com as economias quase todas falidas), que descem quase até zero.
2. Preços dos bens sobem na mesma porque a pressão energética faz-se sentir fora do país e quase tudo vem de fora ou tem uma produção dependente de importações. A descida da carga fiscal permitira comprar tudo mais barato em teoria mas os stocks nem sequer chegam.
3. População é racionada à força pelo preço e começa a acumular reservas de alimentos e combustível em casa, com receio de cortes a longo prazo. Quedas de consumo baixam preços domésticos.
(Esta é a altura em que a queda drástica de procura global faz baixar o consumo e atira os preços para baixo mas em que também as economias entram em recessão profunda. Foi o que começava a suceder no Verão de 2008.)
4. Escassez de bens, intervenção militar para estabelecer cadeias de abastecimento e complementar segurança pública. Emerge maior instabilidade política e económica.
(Este foi o ponto atingido nos países revoltosos do Magrebe)
5. Emissão de pedidos de ajuda a reservas europeias (Portugal é o único país da UE sem reserva alimentar estratégica). Intervenção internacional para estabilização, políticas de emergência a níveis de recursos, paralisações laborais em grande escala com cortes na energia e água.
6. ?
PS.
Para citar o presidente da CAP (e também da presidente o observatório agrícola, já agora):
"Portugal tem um stock alimentar próximo do zero, e agora resume-se provavelmente ao conteúdo do navio que esteja a descarregar neste preciso momento num porto nacional mais o que existe nos supermercados."
Neste caso, o racionamento de energia não seria imposto por razões de falta de energia, nem seria temporário. Provavelmente seria "sine die". Como dizem os autores do artigo, exigiria uma "austeridade planeada", ou seja, uma alteração dos estilos de vida. Para ser um processo aceite, teria que ser justo e igualitário. Implicaria uma alteração enorme face ao que é a prática corrente. A alternativa é não haver futuro para as gerações mais novas.
Para mim também me parece uma opção óbvia, na perspectiva a longo prazo.
Com o risco de soar misantropo, julgo que a sociedade está "mimada" a tal ponto que o mais pequeno acto em prol da comunidade gera logo protestos ou, de forma mais frequente, a mais profunda indiferença.
Nesta fase não estou a contar que se atinjam objectivos neste contexto com a percepção dos riscos ambientais (que existem) e nem conto mesmo com o mais básico senso comum.
Uma cultura consumista só presta atenção a preços e serão esses, em vez de um espírito de comunidade em torno de objectivo partilhado, que terão hipótese de operar uma mudança de estilo de vida.
Avisos em relação às emissões como os do texto do post são sistematicamente ignorados porque não se consegue fazer a ponte para o quotidiano (nem tal é possível). Admito que é uma má estratégia contar com os preços de combustíveis para diminuir emissões mas, por azar, pode acabar por ser a última que resta.
Sim, também não vejo grande saída. De qualquer modo, é importante citar estas referências e dá-las a conhecer.
Boa tarde, caro blogueiro!!
Acabei de ler seu artigo e o achei muito interessante...
Não sei se vc chegou a ler um artigo no meu blog ("O CO2 não é vilão, o CO2 é o gas da vida"), mas posso firmemente te dar razões para as quais a sociedade científica não apoia com tanto vigor a meta de emissões desse gás de efeito estufa:
1- Os estudos mais detalhados têm mostrado que o CO2 não é o maior destruídor da camada de ozônio e consequentemente não pode ser encarado como o responsável pelas mudanças climáticas observadas.
2- A maior parte do C02 gerado atrás da produção de energia, oriunda da combustão de combustíveis fósseis é absorvida pelos oceanos, que são os maiores captadores desse gás, ou seja, apenas 30% de todo CO2 chega de fato a atmosfera.
3- Os CFC´s que foram banidos, são moléculas que pesadas, que muito pouco provável consigam chegar até a atmosfera, sendo portanto incapazes de degradar a camada de ozônio e por conseguinte afetar o clima.
4- Os únicos que lucraram com o acordo de diminuição das emissão, foram os paises desenvolvidos que, conseguiram diminuir as emissões por parte dos emergentes e eles mesmo que é bom nada, afinal de contas, pra que serve os créditos de carbono, se não pros paises desenvolvidos comprarem o direito de poluir!!!
Acho todo esse discurso de redução de CO2 muito lindo, mas na verdade, aqueles ligados com a ciência sabe que de fato, muito pouco do que a comunidade internacional prega é pura balela, com mero fundo capistalista!!!!
Cara Fernanda
Receio que está equivocada a vários níveis naquilo que afirma, confundindo os planos de análise.
O maior equívoco desta disputa em relação ao impacto do CO2 é mesmo cronológico, uma vez que já se vai tornando uma discussão anacrónica.
Por outro lado ainda existe quem "dispute cientificamente o consenso" em torno dos efeitos negativos do tabaco, por sinal atingido graças ao trabalho de outro painel intergovernamental das N.U., prontamente discutado pela "comunidade científica" afecta a certos conglomerados político-económicos, o que torna algo caricata a acusação "de fundo capitalista" a estas questões de segurança e saúde pública .
Podemos, isso sim, discutir quais são os métodos de mitigação mais eficazes, num momento em que se propõe desde geo-engenharias (!), mercados de carbono e o racionamento descrito aqui.
Para sermos produtivos nesta fase convinha questionarmos estas hipóteses.
Quais são os níveis que estou equivocada??? Quais são os argumentos científicos e contundentes que realmente explica que o que eu afirmo não seja a realdade??? E qual a minha confusão diante aos planos de análise???
Acho que discussões desse tipo são esclarecedoras e muito enriquecedoras do ponto de vista científico e como meu único objetivo nas postagens e leitura nos blogs é esclarecer, gostaria que me dissesse!!
Obrigada, desde já
Admito que sim, no entanto os argumentos que invoca são repetidos "ad nauseam", por isso corre o risco de não ser levada a sério.
Como calcula, não tenho tempo nem autoridade para lhe explicar a complexidade do que está envolvido na ciência climática, mas recomendo que comece por aqui
De qualquer maneira, um dos planos de análise onde se equivoca é negar o problema das altrações climáticas a partir da rejeição das "soluções" que os governos dos países desenvolvidos propõem. Tem razão em considerar que essas soluções têm sido uma fraude. Ver
CARBON TRADING – HOW IT WORKS AND WHY IT FAILS Pode descarregar gratuitamente o documento. Mas isso não significa que o problema não exista, significa simplesmente que os governos não estão a ser sérios, e não estão a levar a ciência a sério. Ver por exemplo isto
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